André Breton

André Breton, escritor e poeta francês, nasceu em Tinchebray (Orne) em 1896. Viveu a aventura do surrealismo como uma experiência existencial. No início dos anos 20, aderiu ao movimento Dada, mas cedo se opõe a Tsara. Admirador de Valéry, Rimbaud e Lautréamont, em 1924 lança o famoso Manifesto do Surrealismo.

Activo e rebelde, colaborou em revistas revolucionárias como La Révolution Surrealiste e Le Surréalisme au Service de la Révolution. Entre as suas obras destacam-se Nadjia e O Amor Louco. André Breton morreu em Paris em 1966.

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Poemas

Toujours pour la première fois
C’est à peine si je te connais de vue
Tu rentres à telle heure de la nuit dans une maison oblique à ma fenêtre
Maison tout imaginaire
C’est là que d’une seconde à l’autre
Dans le noir intact
Je m’attends à ce que se produise une fois de plus la déchirure fascinante
La déchirure unique
De la façade et se mon cœur
Plus je m’approche de toi
En réalité
Plus la clé chante à la porte de la chambre inconnue
Où tu m’apparais seule
Tu es d’abord tout entière fondue dans le brillant
L’angle fugitif d’un rideau
C’est un champ de jasmin que j’ai contemplé à l’aube sur une route des environs de Grasse
Avec ses cueilleuses en diagonale
Derrière elles l’aile sombre tombante des plants dégarnis
Devant elles l’équerre de l’éblouissant
Le rideau invisiblement soulevé
Rentrent en tumulte toutes les fleurs
C’est toi aux prises avec cette heure trop longue jamais assez trouble jusqu’au sommeil
Toi comme si tu pouvais être
La même à cela près que je ne te rencontrerai peut-être jamais
Tu fais semblant de ne pas savoir que je t’observe
Merveilleusement je ne suis plus sûr que tu le sais
Ton désœuvrement m’emplit lex yeux de larmes
Une nuée d’interprétations entoure chacun de tes gestes
C’est une chasse à la miellée
Il y a des rocking-chairs sur un pont il y a des branchages qui risquent de t’égratingner dans la forét
Il y a dans une vitrine run Notre-Dame-de-Lorette
Deux belles jambes croisées prises dans de hauts bas
Qui sévasent au centre d’un grand trèfle blanc
Il y a une échelle de soie déroulée sur le lierre
Il y a
Qu’à me pencher sue le précipice et de ton absence
J’ai trouvé le secret
De t’aimer
Toujours pour le première fois

Estar vestido de branco deste homem é evidente que nunca voltará a ser encontrado
Depois o choque duma lança contra um elmo aqui o músico fez maravilhas
É toda a razão que se vai quando podia soar a hora sem que tu estejas presente
Nas sombras do cenário permite-se ao povo contemplar os grandes festins
Comer em cena é sempre do agrado geral
De dentro da empada rematada a faisões
Anões metade pretos metade arco-íris levantam a tampa
E soltam-se ajaezado de guizos e de risos
Brilho contrastado de vestígios de tiros das côdeas sobrantes
Plano sequência do baile dos Ardentes flash-back desfocado do episódio que vem logo
a seguir ao do cervo
Um homem talvez ágil demais desce do alto das torres de Notre-Dame
A rodopiar numa corda
Seu pêndulo de archotes clarão insólito à luz do dia
A sarça dos cinco selvagens quatro deles cativos um do outro o sol de plumas
O duque de Orléans segura o facho a mão a mão fatal
Às oito horas da noite tempos depois a mão
Não esquece a brincar com a luva
A mão a luva uma vez duas vezes três vezes
A um canto com o palácio mais branco em fundo as belas feições ambíguas de Pedro de
Luna a cavalo
Personificando o segundo luminar
Acabar sobre o brasão da rainha em lágrimas
A mágoa Nada mais me é nada, nada me é mais nada
Sim sem ti
O sol

 

 

Marselha, Dezembro de 1940

Tradução: Ernesto Sampaio

Lá no fundo do guarda-sol vejo as prostitutas maravilhosas
Com trajes um pouco antiquados do lado da lanterna cor dos bosques
Levam a passear consigo um grande pedaço de papel estampado
Esse papel que não se pode ver sem que o coração se
nos aperte nos andares altos de uma casa em demolição
Ou uma concha de mármore branco caída no caminho
Ou um colar dessas argolas que se confundem atrás delas nos espelhos
O grande instinto da combustão conquista as ruas
onde elas caminham Direitas como flores queimadas
Com os olhos na distância levantando um vento de pedra
Enquanto imóveis se abismam no centro da voragem
Nada se iguala para mim ao sentido do seu pensamento desligado
A frescura do regato onde os sapatinhos delas
banham a sombra dos seus bicos A realidade daqueles molhos de feno cortado onde desaparecem
Vejo os seus seios que abrem uma nesga de sol na noite profunda
E que se abaixam e se elevam a um ritmo
que é a única exacta medida da vida
Vejo os seus seios que são estrelas sobre as ondas
Seios onde chove para sempre o invisível leite azul

Tradução: Antônio Ramos Rosa

Tenho na minha frente a fada de sal
cuja túnica recamada de cordeiros
desce até ao mar
Cujo véu pregueado
de queda em queda ilumina toda a montanha.

Ela brilha ao sol como um lustro de água iridiscente
E os pequenos oleiros da noite serviram-se das suas
unhas onde a lua não se reflecte
para moldar o serviço de café da beladona.

O tempo enrodilha-se miraculosamente detrás dos seus
sapatos de estrelas de neve
ao longo dum rasto perdido nas carícias
de dois arminhos.

Os perigos anteriores foram ricamente repartidos
e mal extintos os carvões no abrunheiro bravo das sebes
pela serpente coral que sem custo passa
por um delgado
filete de sangue seco
na lareira profunda
sempre sempre esplendidamente negra
Esta lareira onde aprendi a ver
e sobre a qual dança sem cessar
o crepe das costas das primaveras
Aquele que é necessário lançar muito alto para dourar
a mulher em cujos cabelos encontro
o sabor que perdera
O crepe mágico o sinete voador
do amor que é nosso.

 

Tradução: Nicolau Saião 

encontrado aqui

 

A poesia como o amor faz-se na cama
Os seus lençóis desfeitos são a aurora das coisas
A poesia faz-se nas matas

Tem todo o espaço de que precisa
Não este mas o outro condicionado por

O olho do milhafre
O orvalho sobre a cavalinha
A lembrança de Traminer embaciada em bandeja de prata
Uma alta vara de turmalina sobre o mar
E a estrada da aventura mental
Que sobe a prumo
Pára e fica logo coberta de mato

Isto não se apregoa aos quatro ventos
Não é conveniente deixar a porta aberta
Ou chamar testemunhas

Os cardumes de peixes os bandos de melharucos
Os carris à entrada duma grande estação
As luzes das duas margens
Os sulcos do pão
A espuma da ribeira
Os dias do calendário
O hipericão

Acto de amor e acto de poesia
São incompatíveis
Com a leitura do jornal em voz alta

O sentido do raio de sol
O clarão azul que liga as machadadas do lenhador
O fio do papagaio de papel em forma de coração ou de laço
O batimento ritmado da cauda dos castores
A diligência do relâmpago
O arremesso de confeitos do alto de velhas escadas
A avalanche

A câmara dos sortilégios
Não cavalheiros não é a oitava Câmara
Nem os vapores da camarata ao domingo à noite

Os passos de dança transparentes por cima dos mares
A demarcação na parede dum corpo de mulher ao lançar de punhais
As claras volutas do fumo
Os anéis do teu cabelo
A curva da esponja das Filipinas
Os nós da serpente vermelha
A entrada da hera nas ruínas
Tem todo o tempo à sua frente
O abraço poético como o abraço carnal
Enquanto dura
Impede toda a fugida sobre a miséria do mundo

 

Tradução: Ernesto Sampaio

de Poemas, Assírio & Alvim,1994.

Je connais le désespoir dans ses grandes lignes. Le désespoir n'a pas d'ailes, il ne se tient pas nécessairement à une table desservie sur une terrasse, le soir, au bord de la mer. C'est le désespoir et ce n'est pas le retour d'une quantité de petits faits comme des graines qui quittent à la nuit tombante un sillon pour un autre. Ce n'est pas la mousse sur une pierre ou le verre à boire. C'est un bateau criblé de neige, si vous voulez, comme les oiseaux qui tombent et leur sang n'a pas la moindre épaisseur. Je connais le désespoir dans ses grandes lignes. Une forme très petite, délimitée par un bijou de cheveux.

C'est le désespoir. Un collier de perles pour lequel on ne saurait trouver de fermoir et dont l'existence ne tient pas même à un fil, voilà le désespoir. Le reste, nous n'en parlons pas. Nous n'avons pas fini de deséspérer, si nous commençons. Moi je désespère de l'abat-jour vers quatre heures, je désespère de l'éventail vers minuit, je désespère de la cigarette des condamnés. Je connais le désespoir dans ses grandes lignes. Le désespoir n'a pas de coeur, la main reste toujours au désespoir hors d'haleine, au désespoir dont les glaces ne nous disent jamais s'il est mort. Je vis de ce désespoir qui m'enchante. J'aime cette mouche bleue qui vole dans le ciel à l'heure où les étoiles chantonnent.

Je connais dans ses grandes lignes le désespoir aux longs étonnements grêles, le désespoir de la fierté, le désespoir de la colère. Je me lève chaque jour comme tout le monde et je détends les bras sur un papier à fleurs, je ne me souviens de rien, et c'est toujours avec désespoir que je découvre les beaux arbres déracinés de la nuit. L'air de la chambre est beau comme des baguettes de tambour. Il fait un temps de temps. Je connais le désespoir dans ses grandes lignes.

C'est comme le vent du rideau qui me tend la perche. A-t-on idée d'un désespoir pareil! Au feu! Ah! ils vont encore venir... Et les annonces de journal, et les réclames lumineuses le long du canal. Tas de sable, espèce de tas de sable! Dans ses grandes lignes le désespoir n'a pas d'importance. C'est une corvée d'arbres qui va encore faire une forêt, c'est une corvée d'étoiles qui va encore faire un jour de moins, c'est une corvée de jours de moins qui va encore faire ma vie.

Extracto de Le révolver à cheveux blanc, Poésie/Gallimard.

Antes a vida que estes prismas sem espessura mesmo se as cores são mais
puras
Antes ela que esta hora sempre enevoada estas terríveis carruagens de
labaredas frias
Estas pedras sorvadas
Antes este coração engatilhado
Que este charco de múrmurios
Este pano branco a cantar ao mesmo tempo na terra e no ar
E esta benção nupcial que une o meu rosto ao da total fatuidade
Antes a vida

Antes a vida com os seus lençóis de esconjuro
As suas cicatrizes de fugas
Antes a vida antes esta rosácea no meu túmulo
A vida da presença só da presença
Onde uma voz diz Estás aí outra responda Estás aí
Eu pobre de mim não estou
E mesmo quando jogarmos ao que fazemos morrer
Antes a vida

Antes a vida antes a vida Infância venerável
A faixa que parte dum faquir
Parece o escorregadouro do mundo
Não importa que o sol não passe de um destroço
Por pouco que o corpo da mulher se lhe compare
Pensas tu ao contemplar a extensão da trajectória
Ou tão-só ao fechar os olhos sobre a tormenta adorável que se chama a tua
mão
Antes a vida

Antes a vida com as suas salas de espera
mesmo sabendo não ir entrar nunca
Antes a vida que estas estâncias termais
Onde o serviço é feito por coleiras
Antes a vida adversa e longa
Quando aqui os livros se fecharem sobre estantes menos suaves
E lá longe fizer mais que melhor fizer livre sim
Antes a vida

Antes a vida como fundo de desdém
A esta cabeça já de si tão bela
Como antídoto da perfeição aspirada e temida
A vida a maquilhagem de Deus
A vida como um passaporte virgem
Ou uma vilória como Pont-à-Mousson
E como tudo foi dito já
Antes a vida

 

 

tradução: Ernesto Sampaio