Dylan Thomas

Dylan Marlais Thomas, nasceu em Swansea, no País de Gales, em 1914. Sem estudos superiores, foi jornalista e escritor. Escreveu sobretudo poemas e contos. Saído de uma escola literária que teve autores como T. S. Eliot, Edith Sitwell, W. H. Auden ou Stephen Spender, deixou-nos uma poesia, intensa, contemporânea, plena de vivência dos sentidos, que toca a sensibilidade de gerações e se mantém viva, em muitas línguas. «Deaths and Entrances" (1946) é um dos seus livros mais conhecidos, a par com os seus «Collected Poems» (1934-1952).

Actualmente é considerado um dos mais importantes poetas universais do século XX. A sua obra é estudada nas Universidades.  Bob Dylan usou o seu sobrenome como pseudónimo artístico. Dylan Thomas levou uma vida desordenada e alcoólica, em breve consumida. Faleceu aos trinta e nove anos, em 1953, durante uma tournée de leitura de poemas, em Nova Iorque.

 

 

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Poemas

The force that through the green fuse drives the flower
Drives my green age; that blasts the roots of trees
Is my destroyer.
And I am dumb to tell the crooked rose
My youth is bent by the same wintry fever.

The force that drives the water through the rocks
Drives my red blood; that dries the mouthing streams
Turns mine to wax.
And I am dumb to mouth unto my veins
How at the mountain spring the same mouth sucks.

The hand that whirls the water in the pool
Stirs the quicksand; that ropes the blowing wind
Hauls my shroud sail.
And I am dumb to tell the hanging man
How of my clay is made the hangman's lime.

The lips of time leech to the fountain head;
Love drips and gathers, but the fallen blood
Shall calm her sores.
And I am dumb to tell a weather's wind
How time has ticked a heaven round the stars.

And I am dumb to tell the lover's tomb
How at my sheet goes the same crooked worm.

A força que impele através do verde rastilho a flor
impele os meus verdes anos; a que aniquila as raízes das árvores
é o que me destrói.
E não tenho voz para dizer à rosa que se inclina
como a minha juventude se curva sobre a febre do mesmo inverno.

A força que impele a água através das pedras
impele o meu rubro sangue; a que seca o impulso das correntes
deixa as minhas como se fossem de cera.
E não tenho voz para que os lábios digam às minhas veias
como a mesma boca suga as nascentes da montanha.

A mão que faz oscilar a água no pântano
agita ainda mais as da areia; a que detém o sopro do vento
levanta as velas do meu sudário.
E não tenho voz para dizer ao homem enforcado
como da minha argila é feito o lodo do carrasco.

Como sanguessugas, os lábios do tempo unem-se à fonte;
fica o amor intumescido e goteja, mas o sangue derramado
acalmará as suas feridas.
E não tenho voz para dizer ao dia tempestuoso
como as horas assinalam um céu à volta dos astros.

E não tenho voz para dizer ao túmulo da amada
como sobre o meu sudário rastejam os mesmos vermes.


tradu

ção: Fernando Guimarães

A Mão ao Assinar Este Papel, Assírio & Alvim, 1998

 

Do not go gentle into that good night,
Old age should burn and rage at close of day;
Rage, rage against the dying of the light.

Though wise men at their end know dark is right,
Because their words had forked no lightning they
Do not go gentle into that good night.

Good men, the last wave by, crying how bright
Their frail deeds might have danced in a green bay,
Rage, rage against the dying of the light.

Wild men who caught and sang the sun in flight,
And learn, too late, they grieved it on its way,
Do not go gentle into that good night.

Grave men, near death, who see with blinding sight
Blind eyes could blaze like meteors and be gay,
Rage, rage against the dying of the light.

And you, my father, there on the sad height,
Curse, bless, me now with your fierce tears, I pray
Do not go gentle into that good night.
Rage, rage against the dying of the light.

Não penetres submisso nessa boa noite.
A velhice deve arder e danar-se ao cair do dia;
Raiva, raiva contra o morrer da luz.

Embora os sages ao fPorque as palavras deles não bifurcaram relâmpagos,
Não penetres submisso nessa boa noite.

Homens bons, ida a última vaga, chorando quão brilhantes
Seus frágeis feitos podiam ter dançado nas baías verdes.
Raivam, raivam contra o morrer da luz.

Homens bravios que prenderam e cantaram o sol em voo
E aprenderam, já tarde, que o feriram em seu caminho,
Não penetram submissos nessa boa noite.

Homens graves, perto da morte, que vêem com cegante vista
Que olhos cegos podiam esbrasear-se como joviais meteoros,
Raivam, raivam contra o morrer da luz.

E tu, meu pai, aí na triste altura,
Maldiz, bendiz-me agora com ferozes lágrimas, suplico.
Não penetres submisso nessa boa noite.
Raiva, raiva contra o morrer da luz.


tradução: Jorge de Sena

de Poesia do século XX, ASA, 2003

Sometimes the sky's too bright,
Or has too many clouds or birds,
And far away's too sharp a sun
To nourish thinking of him.
Why is my hand too blunt
To cut in front of me
My horrid images for me,
Of over-fruitful smiles,
The weightless touching of the lip
I wish to know
I cannot lift, but can,
The creature with the angel's face
Who tells me hurt,
And sees my body go
Down into misery?
No stopping. Put the smile
Where tears have come to dry.
The angel's hurt is left;
His telling burns.

Sometimes a woman's heart has salt,
Or too much blood;
I tear her breast,
And see the blood is mine,
Flowing from her, but mine,
And then I think
Perhaps the sky's too bright;
And watch my hand,
But do not follow it,
And feel the pain it gives,
But do not ache.


poema lido aqui

 

And death shall have no dominion.
Dead men naked they shall be one
With the man in the wind and the west moon;
When their bones are picked clean and the clean bones gone,
They shall have stars at elbow and foot;
Though they go mad they shall be sane,
Though they sink through the sea they shall rise again;
Though lovers be lost love shall not;
And death shall have no dominion.

And death shall have no dominion.
Under the windings of the sea
They lying long shall not die windily;
Twisting on racks when sinews give way,
Strapped to a wheel, yet they shall not break;
Faith in their hands shall snap in two,
And the unicorn evils run them through;
Split all ends up they shan't crack;
And death shall have no dominion.

And death shall have no dominion.
No more may gulls cry at their ears
Or waves break loud on the seashores;
Where blew a flower may a flower no more
Lift its head to the blows of the rain;
Though they be mad and dead as nails,
Heads of the characters hammer through daisies;
Break in the sun till the sun breaks down,
And death shall have no dominion.

***

E a morte perderá o seu domínio.
Nus, os homens mortos irão confundir-se
com o homem no vento e na lua do poente;
quando, descarnados e limpos, desaparecerem os ossos
hão-de nos seus braços e pés brilhar as estrelas.
Mesmo que se tornem loucos permanecerá o espírito lúcido;
mesmo que sejam submersos pelo mar, eles hão-de ressurgir;
mesmo que os amantes se percam, continuará o amor;
e a morte perderá o seu domínio.

E a morte perderá o seu domínio.
Aqueles que há muito repousam sobre as ondas do mar
não morrerão com a chegada do vento;
ainda que, na roda da tortura, comecem
os tendões a ceder, jamais se partirão;
entre as suas mãos será destruída a fé
e, como unicórnios, virá atravessá-los o sofrimento;
embora sejam divididos eles manterão a sua unidade;
e a morte perderá o seu domínio.

E a morte perderá o seu domínio.
Não hão-de gritar mais as gaivotas aos seus ouvidos
nem as vagas romper tumultuosamente nas praias;
onde se abriu uma flor não poderá nenhuma flor
erguer a sua corda em direcção à força das chuvas;
ainda que estejam mortas e loucas, hão-de descer
como pregos as suas cabeças pelas margaridas;
é no sol que irrompem até que o sol se extinga,
e a morte perderá o seu domínio.

 

tradução: Fernando Guimarães.

de A Mão Ao Assinar Este Papel, Assírio & Alvim, 1998

A process in the weather of the heart
Turns damp to dry; the golden shot
Storms in the freezing tomb.
A weather in the quarter of the veins
Turns night to day; blood in their suns
Lights up the living worm.

A process in the eye forwarns
the bones of blindness; and the womb
Drives in a death as life leaks out.

A darkness in the weather of the eye
Is half its light; the fathomed sea
Breaks on unangled land.
The seed that makes a forest of the loin
Forks half its fruit; and half drops down,
Slow in a sleeping wind.

A weather in the flesh and bone
Is damp and dry; the quick and dead
Move like two ghosts before the eye.

A process in the weather of the world
Turns ghost to ghost; each mothered child
Sits in their douible shade.
A process blows the moon into the sun,
Pulls down the shabby curtains of the skin;
And the heart gives up its dead.

Vem uma mudança no tempo do coração
secar a sua seiva, e um brilho que nos fere
vibra no interior glacial do túmulo.
Transforma-se na cidade das veias
a noite em dia, e movem-se ali os vermes
sob o reflexo solar do próprio sangue.

Vem uma mudança ocultar nos olhos
os ossos da cegueira, e então o ventre
mergulha na morte como o aparecimento da vida.

A escuridão no tempo dos olhos
encontra-se com a luz; a profundidade do mar
rompe sobre uma terra sem arestas.
A semente, que gera dos flancos um bosque
vem dividir o seu fruto, e cada metade
derrama-se lentamente no vento adormecido.

O tempo ao percorrer a nossa carne e os ossos
fica húmido e seco; o que desperta e o que morre
junto dos olhos são como dois espíritos.

Vem uma mudança no tempo do mundo
transformar um espírito no outro, e cada criança
na sua mãe amolda-se sob uma dupla sombra.
Assim é arrastada a lua em direcção ao sol,
da pele são removidas as andrajosas vestes,
e o coração abandona-se à morte.

 

 

tradução: Fernando Guimarães.

de A Mão Ao Assinar Este Papel, Assírio & Alvim, 1998



It was my thirtieth year to heaven
Woke to my hearing from harbour and neighbour wood
And the mussel pooled and the heron
Priested shore
The morning beckon
With water praying and call of seagull and rook
And the knock of sailing boats on the net webbed wall
Myself to set foot
That second
In the still sleeping town and set forth.

My birthday began with the water-
Birds and the birds of the winged trees flying my name
Above the farms and the white horses
And I rose
In the rainy autumn
And walked abroad in a shower of all my days.
High tide and the heron dived when I took the road
Over the border
And the gates
Of the town closed as the town awoke.

A springful of larks in a rolling
Cloud and the roadside bushes brimming with whistling
Blackbirds and the sun of October
Summery
On the hill's shoulder,
Here were fond climates and sweet singers suddenly
Come in the morning where I wandered and listened
To the rain wringing
Wind blow cold
In the wood faraway under me.

Pale rain over the dwindling harbour
And over the sea wet church the size of a snail
With its horns through mist and the castle
Brown as owls
But all the gardens
Of spring and summer were blooming in the tall tales
Beyond the border and under the lark full cloud.
There could I marvel
My birthday
Away but the weather turned around.

It turned away from the blithe country
And down the other air and the blue altered sky
Streamed again a wonder of summer
With apples
Pears and red currants
And I saw in the turning so clearly a child's
Forgotten mornings when he walked with his mother
Through the parables
Of sun light
And the legends of the green chapels

And the twice told fields of infancy
That his tears burned my cheeks and his heart moved in mine.
These were the woods the river and sea
Where a boy
In the listening
Summertime of the dead whispered the truth of his joy
To the trees and the stones and the fish in the tide.
And the mystery
Sang alive
Still in the water and singing birds.

And there could I marvel my birthday
Away but the weather turned around. And the true
Joy of the long dead child sang burning
In the sun.
It was my thirtieth
Year to heaven stood there then in the summer noon
Though the town below lay leaved with October blood.
O may my heart's truth
Still be sung
On this high hill in a year's turning.

Era o meu trigésimo ano rumo ao céu
Quando chegou aos meus ouvidos, vindo do porto
e do bosque ao lado,
E da praia empoçada de mexilhões
E sacralizada pelas garças
O aceno da manhã

Com as preces da água e o grito das gralhas e gaivotas
E o chocar-se dos barcos contra o muro emaranhado de redes
Para que de súbito
Me pusesse de pé
E descortinasse a imóvel cidade adormecida.

Meu aniversário começou com as aves marinhas
E os pássaros das árvores aladas esvoaçavam o meu nome
Sobre as granjas e os cavalos brancos
E levantei-me
No chuvoso outono
E perambulei sem rumo sob o aguaceiro de todos os meus dias.
A garça e a maré alta mergulhavam quando tomei a estrada
Acima da divisa
E as portas da cidade
Ainda estavam fechadas enquanto o povo despertava.

Toda uma primavera de cotovias numa nuvem rodopiante
E os arbustos à beira da estrada transbordante de gorjeios
De melros e o sol de outubro
Estival
Sobre os ombros da colina,
Eram climas amorosos e houve doces cantores
Que chegaram de repente na manhã pela qual eu vagava e ouvia
Como se retorcia a chuva
O vento soprava frio no bosque ao longe que jazia a meus pés.

Pálida chuva sobre o porto que encolhia
E sobre o mar que humedecia a igreja do tamanho de um caracol
Com seus cornos através da névoa e do castelo
Encardido como as corujas Mas todos os jardins
Da primavera e do verão floresciam nos contos fantásticos
Para além da divisa e sob a nuvem apinhada de cotovias.
Ali podia eu maravilhar-me
Meu aniversário ia adiante mas o tempo girava em derredor.

Ao girar me afastava do país em júbilo
E através do ar transfigurado e do céu cujo azul se matizava
Fluía novamente um prodígio do verão
Com maçãs
Peras e groselhas encarnadas
E no girar do tempo vi tão claro quanto uma criança
Aquelas esquecidas manhãs em que o menino passeava com sua mãe Em meio às parábolas
Da luz solar
E às lendas da verde capela

E pêlos campos da infância duas vezes descritos
Pois suas lágrimas me queimavam as faces e seu coração
se enternecia em mim.
Esses eram os bosques e o rio e o mar
Ali onde um menino
À escuta
Do verão dos mortos sussurrava a verdade de seu êxtase
Às árvores e às pedras e ao peixe na maré.
E todavia o mistério
Pulsava vivo Na água e nos pássaros canoros.

E ali podia eu maravilhar-me com meu aniversário
Que fugia, enquanto o tempo girava em derredor. Mas a verdadeira
Alegria da criança há tanto tempo morta cantava
Ardendo ao sol.
Era o meu trigésimo ano
Rumo ao céu que então se imobilizara no meio-dia do verão
Embora a cidade repousasse lá embaixo coberta de folhas no sangue de outubro.

Oh, pudesse a verdade de meu coração
Ser ainda cantada
Nessa alta colina um ano depois.

 

Traduçao : van Junqueira

Light breaks where no sun shines;
Where no sea runs, the waters of the heart
Push in their tides;
And, broken ghosts with glow-worms in their heads,
The things of light
File through the flesh where no flesh decks the bones.

A candle in the thighs
Warms youth and seed and burns the seeds of age;
Where no seed stirs,
The fruit of man unwrinkles in the stars,
Bright as a fig;
Where no wax is, the candle shows its hairs.

Dawn breaks behind the eyes;
From poles of skull and toe the windy blood
Slides like a sea;
Nor fenced, nor staked, the gushers of the sky
Spout to the rod
Divining in a smile the oil of tears.

Night in the sockets rounds,
Like some pitch moon, the limit of the globes;
Day lights the bone;
Where no cold is, the skinning gales unpin
The winter’s robes;
The film of spring is hanging from the lids.

Light breaks on secret lots,
On tips of thought where thoughts smell in the rain;
When logics die,
The secret of the soil grows through the eye,
And blood jumps in the sun;
Above the waste allotments the dawn halts.

A luz rompe onde o sol não brilha;
Onde o mar não corre, as águas do coração
Avançam suas marés;
E, quebrados espectros com pirilampos nas cabeças.
As coisas da luz
Insinuam-se na carne onde carne não cobre os ossos.

Um círio entre as pernas
Aquece a juventude e o sémen e queima o sémen da idade;
Onde sémen se não agita,
O fruto do homem incha nas estrelas,
Brilhante como um figo;
Onde cera não há, o círio mostra os seus cabelos.

 

tradução: Jorge de Sena

de Poesia do século XX, ASA, 2003