Ivan Laučik

Ivan Laučik, poeta eslovaco, nasceu em Liptov, em 1944. Foi professor de literatura na sua terra natal. A publicação da sua obra poética esteve proibida durante os dezoito anos de regime comunista Checoslovaco.

Com a fundação do Grupo literário Solitary Runners (Os corredores solitários), em 1964, a sua poesia foi finalmente divulgada. Este movimento adoptou um programa «anti-literário» e «anti-poesia», imprimindo aos textos um forte conteúdo ético.

Em Portugal, a editora  Livros Quetzal, publicou em 1999 Mobilis in Mobile.

Ivan Laučik, morreu no dia 12 de maio de 2004

 

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Poemas

A QUEM PERGUNTAS?

A vós a quem a luz aquece,
na abertura da luz,
inteiramente resguardados,
não é possível tocar-vos as entranhas e perguntar:
Onde apanhastes isso?

À beira do mar que contém as visões dos outros
e os rostos a quem já não é possível molestar -
a quem perguntas?

Quando se abre uma cratera
a fronteira renova-se, o fogo sossega.

Quando te cobres de flores,
quem sabe se é para adormeceres ou para acordares
para os actos mais puros?

ANOTAÇÃO DE FIM DE TARDE

Nada importa, dizem-te pela manhã:
E tu (vês-te obrigado) duvidas destas palavras todo o dia.

Resiste, entretém os peixes,
canta-lhes em voz alta sobre a ponte...
Os momentos de alegria quase te envergonham:
As distâncias convenientes, relações de altura e profundidade,
os invernos curtos, vento em conta para os moínhos -
e um tempo longo coberto
de ornamentos de ferro!
(Os livros de Lógica estão gastos
pelas mãos e pelo suor!)

Alguém que ouve mal embriaga-se de palavras:
o futuro pertence apenas aos helicópteros silenciosos,
capazes de aterrar na palma da mão.
(Haverá palma da mão?) E continua em sonhos
a separar-se o comestível do que não presta.

Sim, chegam-nos plantas cheias de entusiasmo.
Mas não é por isso que a folha artificial é menos verde.

Assim os incrédulos valorizam a fé.
Os infalíveis esperam ser salvos pelos nossos erros.
Os vivos sabem
que tudo importa
desde manhã.

NO LIMIAR

Chuvas
silenciosas verdes desabaram
nas cinzas e nas frágeis construções das Tuas criaturas
e inundaram-nas com alimentos.

O eco da primeira explosão está presente
no brilho,
na angústia das grutas,
e ressoa nas nossas memórias.

Interior revelado do dilúvio:
os olhos abertos
para a fragilidade
das formações de neve!

Plantas glaciares que vivem
no vento.
Trazemo-las dentro de nós à noite, no inverno.

A visão
das formosas colunas, da luz vertiginosa
nos cumes rochosos
no interior das cavernas.
Foi apenas tremor?
Vidro tocando o olho:
limpando o olhar.

E sempre em frente
da crina nevada das montanhas.
Cabelos esvoaçantes (incendiados da nuca
até ao rosto)
como um pólen selvagem
na memória do fogo.

Oh, fulgor das plantas distantes,
captado por uma película interior!

A erva acesa nas colinas,
os que atearam o fogo fugiram pelos jardins.

Quem conta isto segreda-nos de perto:
O que é aqui alimento?


tradução colectiva da série Poetas em Mateus

de Mobilis in Mobile, Quetzal Editores, 1999